Wednesday, March 25, 2009

"condenados a [x] anos de cadeia com pena suspensa por igual período"

Condenados a [x] anos de cadeia com pena suspensa por igual período. Condenados a tantos anos com pena suspensa por igual período. Condenados com pena suspensa por igual período. Pena suspensa por igual período. Pena suspensa. Sempre pena suspensa.

Em Portugal há esta lei terrível e recente que proíbe o Ministério Público de pedir pena de prisão efectiva sempre que o crime em questão seja punível no máximo com y anos de prisão. E creio haver também uma norma, também recente e terrível, que obriga os juízes a suspender quaisquer penas de prisão desde que a duração vá até z anos.

Crimes financeiros, crimes de sangue, crimes do pior, quaisquer crimes: já não se trata apenas de uma probabilidade baixa, por vários motivos, de um criminoso ser preso: trata-se de uma probabilidade nula.

Os números da impunidade no sistema penal português são estes: a probabilidade de um criminoso ser identificado e "apanhado" é baixa VEZES a probabilidade de se tornar acusado é baixa VEZES a probabilidade de alguma coisa ficar provada é baixíssima VEZES a probabilidade de ser condenado é baixíssima VEZES a probabilidade de, todos os recursos passados, a pena ser reduzida é alta VEZES a probabilidade de, transitada em julgado, a punição ser a prisão é baixíssima VEZES a probabilidade de a pena de prisão não ser "suspensa por igual período" é praticamente nula.

Número final, o número da impunidade penal portuguesa: a priori, antes do acto, no momento de decidir mato/não mato, violo/não violo, espanco/não espanco, torturo/não torturo - nesse momento, aquele que tem intenção de praticar um crime, sabe que a probabilidade de um dia vir a ser preso, preso efectivo, é aproximadamente zero.


O que ainda vai garantindo alguma paz social em Portugal é a falta de "consciência de classe" em relação à impunidade: a maior parte das pessoas talvez só vagamente se tenha apercebido da impunidade geral, por um lado, e, por outro e mais importante lado, a maior parte das pessoas, mesmo que se tenham apercebido disso, não têm conhecimento de que outras pessoas estão igualmente idignadas.

O que separa a indignação geral da revolta geral é só isto: uma assimetria de informação. Quando toda a gente souber que toda a gente sabe, pensa e sente o mesmo, então o resultado necessário será o fim da paz social.